Alfredo Di Stéfano
Alfredo Di Stéfano Laulhé (Buenos Aires, 4 de julho de 1926) é um ex-futebolista e treinador argentino, que, além de ter jogado pela Seleção Argentina, jogou também pela Colômbia e pela Espanha. É considerado um jogador brilhante, e um dos melhores de todos os tempos. Sua velocidade e a cor dos cabelos lhe renderiam a alcunha de "A Flecha Loira".[1] É desde 2000 o presidente honorário do Real Madrid,[2] clube cuja história de sucesso confunde-se com a dele: foi com ele em campo que o Real tornou-se o maior vencedor da cidade de Madrid, da Espanha e da Europa. Foi responsável também por alimentar a rivalidade com o Barcelona, que não tinha a mesma expressão.[3] Ele é presidente honorário também da UEFA, desde 2008.[1]
Não são poucos, especialmente argentinos e espanhóis, que o consideram o melhor jogador do século XX, à frente de Pelé e Diego Maradona.[4] Pelo próprio Maradona, curiosamente ex-jogador de Boca Juniors e Barcelona, dois rivais de clubes defendidos por Di Stéfano, já foi considerado o melhor.[3] Opiniões semelhantes têm aqueles que foram seus adversários contumazes: Joaquín Peiró, que jogava pelo Atlético de Madrid, afirmou: "Para mim, o número 1 é Di Stéfano. Aqueles que o viram, viram. Aqueles que não o viram, perderam". Helenio Herrera, técnico do Barcelona, declarou que "se Pelé foi o violinista principal, Di Stéfano foi a orquestra inteira".[3] Gianni Rivera e Bobby Charlton, que no início de suas carreiras enfrentaram (e perderam) por seus respectivos clubes (Milan e Manchester United) para La Saeta Rubia e o Real Madrid na Taça dos Campeões Europeus, nos anos 1950, disseram respectivamente que "ele nos enlouqueceu" e "foi o jogador mais inteligente que vi jogar e transpirava esforço e coragem. Foi um líder inspirador e um exemplo perfeito para os outros jogadores".[3]
Desnecessário afirmar a opinião de madridistas exaltados: "Ele fez a Espanha torcer pelo Real Madrid. E também foi ele que levou o nome do clube além das fronteiras", disse o presidente Ramón Calderón. O editor de esportes do As, jornal favorável ao clube, falou que "Para as crianças dos anos 1950, Di Stéfano era, acima de tudo, o som da vitória que se ouvia nas rádios, seu nome ecoava como uma batida do coração associada sempre a uma sensação de vitória, transportando-nos ao Parc des Princes, San Siro ou Hampden Park". Para Emilio Butragueño, ex-jogador e atualmente membro da diretoria, "a história do Real Madrid começa de fato com a vinda de Di Stéfano".[3]
Don Alfredo, contudo, prefere desvencilhar-se da polêmica; ele diz que, para ele, o melhor jogador foi Adolfo Pedernera, astro do River Plate nos anos 1940.[5] Uma das poucas mágoas na carreira foi não ter jogado uma Copa do Mundo, embora tenha atuado por três países [6] - chegou a ir para a de 1962 pela Espanha, mas uma lesão o impediu de atuar.[6] Como treinador, obteve mais sucesso no Valencia e também possui uma marca histórica na função: foi o único a ser campeão argentino treinando os arquirrivais Boca Juniors e River Plate.[1]
Habilidades
Di Stéfano, desde o início, era um obcecado pelo gol. No começo da carreira, na Argentina, portava-se justamente como um centroavante. "Entre fazer o gol e dar o gol para outro, não vacilava. Fazia eu. Não me arrependo disso. O goleador tem mesmo que ser um tanto egoísta. (...) O futebol para mim era feito de gols, muitos gols. Gols meus.", chegou a declarar. Aperfeiçoou seu estilo fora da terra natal, passando a também a voltar da área adversária para buscar o jogo, atuando como ponta-de-lança, tendo toda a capacidade para isso: era dotado de excepcional preparo físico, o que lhe permitia correr todo o campo durante uma partida inteira mesmo depois dos 30 anos.[7] Jogou em alto nível até os 40, decidindo por encerrar a carreira apenas por pedido do filho, quando soube por este que seria avô.[8]
Possuidor de estonteante velocidade que lhe renderia o apelido de "Flecha Loira", combatia, desarmava, tinha grande inteligência para criar jogadas, habilidade para receber, tratar, conduzir, cabecear e passar a bola, além de precisão nos arremates.[7]
Início
Quando criança, não se imaginava como jogador de futebol, preferindo a carreira de aviador, apesar dos incentivos do pai. Só começou a gostar do jogo após marcar três gols quando, aos 17 anos, foi chamado às pressas para completar o time do bairro.[4] Um outro acaso lhe destinou a seu primeiro clube, o River Plate, onde já havia jogado seu pai.[4] Foi levado à equipe por um ex-jogador desta que, em visita casual em sua casa, ouviu da mãe de Di Stéfano que o garoto tinha talento.[3] Passou no teste e foi convidado pelo ex-jogador Carlos Peucelle a entrar na quarta categoria do clube,[9] logo subindo para terceira após ser visto por outro antigo atleta do River, Renato Cesarini.[9] Cesarini, depois que o observou, indagou a Peucelle: "diga-me, é um center-forward"? No que foi respondido: "Não, senhor, não é. É um fenômeno".[7]
Debutou pelo River em 1945, quando o clube possuía um esquadrão conhecido como La Máquina com, além de Pedernera, Juan Carlos Muñoz, José Manuel Moreno, Ángel Labruna e Félix Loustau,[10] conquistando o campeonato argentino do ano. Outro celebrado jogador do clube com quem jogou foi o goleiro Amadeo Carrizo, que também estreou naquele ano de 1945.[11] Na vitoriosa campanha, porém, ele participou de apenas uma partida, substituindo Muñoz.[9]
Huracán
Sem espaço, Di Stéfano acabou emprestado por um ano ao Huracán, curiosamente a mesma equipe contra a qual havia debutado.[2][12] Ali, foi treinado pelo ex-artilheiro Guillermo Stábile, que também era o técnico da Seleção Argentina. Os primeiros dois gols de sua carreira vieram justamente em uma vitória por 3 x 2 no clássico contra o San Lorenzo, em pleno estádio do arquirrival,[12] que seria o campeão argentino daquele 1946.[13] Di Stéfano também não perdoou o River Plate: contra sua ex-equipe, marcou o que é até hoje o gol mais rápido do futebol argentino, aos onze segundos de jogo.[12]
Em Parque Patricios, fixou-se como centroavante e marcou dez gols em 25 partidas pelos quemeros,[4] sendo um destaque da campanha mediana do time, que terminou apenas em nono.[13] Foi ali também que ele recebeu, por sua velocidade, a alcunha de Saeta ("flecha"). Como o colega de equipe Llamil Simes tinha o mesmo apelido, o de Di Stéfano recebeu o acréscimo Rubia ("loira").[12] O Huracán quis ficar com ele em definitivo, mas não tinha viabilidade para pagar os 80 mil pesos pedidos pelo River.[9] Após um ano no Globo, regressou a Núñez, em 1947.[4]
River Plate
A situação lhe era diferente: Pedernera saíra para o Atlanta,[9][14] Labruna estava com hepatite e Muñoz, lesionado.[9] Finalmente teve mais oportunidades no River, com o dia de sua reestreia sendo apontado por ele mesmo como o melhor de sua carreira, trazendo sempre no bolso um pequeno distintivo gravado com a inscrição "River Plate-San Lorenzo de Almagro, 1947".[3]
Mesmo intercalando os jogos com o serviço militar,[9] ele marcou 27 gols pelo River em 1947,[9] conduzindo o clube a novo título no campeonato argentino, o primeiro de Di Stéfano como membro efetivo no grupo,[2][4] e tendo terminado como artilheiro do certame.[15] A torcida não tardou a se render ao jovem, louvando-lhe com canções como "Socorro, socorro, ahí viene la Saeta con su propulsión a chorro" ("Socorro, socorro, aí vem a Flecha com sua propulsão a jato").[9]
Suas atuações em 1947 lhe levariam naquele ano à Seleção Argentina.[2] Por este título, os riverplatenses foram convidados para o Campeonato Sul-Americano de Campeões, torneio realizado em 1948 admitido oficialmente como equivalente à futura Taça Libertadores da América.[16] O River veio ao Brasil se preparar para o torneio, jogando amistosos em São Paulo. O arquirrival Boca Juniors, que não participaria, veio na mesma época para a mesma cidade. Curiosamente, organizou-se um amistoso a ser disputado entre um combinado dos paulistas e outro dos rivais argentinos; neste partida, o uniforme do Palmeiras foi usado pelos jogadores de River e Boca, uma vez que os jogadores de cada um não queriam usar a roupa do rival.[17] O torneio foi decidido entre River e Vasco da Gama, que, tendo a vantagem do empate, sagrou-se campeão ao segurar um 0 x 0.[16]
A promissora trajetória de Di Stéfano no River seria interrompida no ano seguinte. Ele trocou os Millonarios, como também era conhecido o River, por um clube homônimo ao apelido. Os jogadores argentinos haviam realizado uma greve exigindo assistência médica para os familiares, um salário mínimo para a categoria e a extinção do passe, para serem livres para escolher onde gostariam de jogar.[10] Todavia, não foram atendidos, o campeonato parou e muitos foram jogar em outros países.[10] No caso de Di Stéfano, o Millonarios, que lhe ofercera proposta bastante tentadora financeiramente.[4] Deixou o River Plate com 49 gols em apenas 66 jogos.[9]
Millonarios
Chegou ao clube de Bogotá em 1949 juntamente com o ídolo Pedernera e seu ex-colega de River Néstor Rossi.[14] A liga colombiana havia se transformado em um verdeiro Eldorado,[18] atraindo os jogadores do continente que, embora fossem atletas profissionais, não costumavam ser bem pagos em seus países.[18] O dono do Millonarios, Alfredo Senior, havia resolvido lucrar com o esporte, aliciando os melhores atletas sul-americanos para jogar em sua equipe a fim de atrair grandes públicos, o que naturalmente repercutiu negativamente no exterior.[18] Além disso, o clube era intimamente ligado ao poder local, sendo atraente para quem tivesse pretensões políticas.[19]
Os demais clubes colombianos em geral tomaram medidas similares: os peruanos se concentraram nas equipes de Cali e Medellín, os paraguaios em Cúcuta, alguns brasileiros - como Heleno de Freitas e Tim -, em Barranquilla;[20] Mesmo jogadores britânicos, iugoslavos, italianos e húngaros foram atraídos.[19] Os dirigentes locais queriam implantar o profissionalismo no futebol do país, enquanto a federação prezava pelo amadorismo;[20] além disso, o futebol colombiano ainda vivia apenas de competições regionais.[19] Muitos clubes se desfiliaram então de federação para organizar um campeonato nacional, que acabaria banido pela FIFA por desrespeitar regulamentos da entidade no que dizia respeito a diretrizes de transferência e limite de estrangeiros,[18] embora ironicamente modelos similares se tornassem comuns na Europa meio século depois.[18][20]
Por outro lado, o banimento abriu uma brecha para que os clubes colombianos não precisassem pagar multas rescisórias às equipes estrangeiras onde buscavam jogadores [20] (pois a liga pirata encontrava-se fora da jurisdição da FIFA [19]), o que naturalmente também irritou as outras federações sul-americanas.[18] Para Senior, bastava oferecer um salário melhor e uma passagem apenas de ida para a Colômbia.[18] O próprio governo colombiano, que vivia momento político conturbado, viu no futebol uma boa forma para tirar tal foco da sociedade, além de passar uma imagem positiva local e externamente.[19]
Na liga pirata,[4] Di Stéfano logo foi campeão do campeonato colombiano, que conquistaria ainda em 1951 e 1953, integrando o chamado Ballet Azul.[14] Na Colômbia, onde a liga vinha sendo um grande sucesso de público,[20] ele aprimorava-se como jogador, passando também a defender e passar a bola com maestria.[4] Além de Pedernera e Rossi, Di Stéfano jogou ainda ao lado de Julio Cozzi, Antonio Báez, Reinaldo Mourín e Hugo Reyes, também argentinos expatriados, assim como o técnico Carlos Aldabe.[21] O time contava ainda com dois uruguaios de destaque: Schubert Gambetta, campeão da Copa do Mundo de 1950, e Héctor Scarone, também campeão mundial, mas da Copa de 1930, que foi outro treinador do elenco.[19]
Aborrecidas com a contínua investida da liga colombiana sobre os jogadores do continente e sem nada receber pelas saídas deles,[20] as federações vizinhas fizeram um acordo em 1951: permitiriam que tal situação perdurasse por mais dois anos, quando então os jogadores estrangeiros deveriam ser todos devolvidos a seus clubes de origem.[18] O Millonarios decidiu aproveitar o tempo que tinha e lucrar o máximo com amistosos ao redor do mundo.[18] Em um deles, em 1952, a equipe foi chamada para jogar uma partida contra o Real Madrid, que celebrava o aniversário de cinquenta anos deste clube.[22] Em pleno Chamartín, Di Stéfano marcou duas vezes na vitória por 4 x 2 dos sul-americanos.[22] Foi imediatamente contratado pelo Barcelona, outra equipe espanhola.[23]
O argentino deixou o Millonarios como o maior artilheiro da história do time, totalizando 267 gols em 292 partidas.[22] Além de títulos e artilharias na Colômbia, venceu com o clube também a Pequena Taça do Mundo de 1953, chegando a marcar dois gols em um 5 x 1 sobre sua ex-equipe do River na competição.[24] Com Di Stéfano, o clube também abriu larga vantagem em títulos colombianos cujos efeitos ainda perduram, sendo a equipe mais vencedora do campeonato nacional mesmo não o conquistando desde 1988;[25] apenas em 2008 foi igualado pelo América de Cali.[25]
Fonte: Wikipedia.